Um jogo típico observado em nossa prática e os seus diferentes graus. Como lidamos com esse jogo e as formas de responder aos jogos segundo Dussay.

Por José Silveira Passos

Cliente do sexo feminino, 43 anos, casada, dois filhos, um com dezesseis e outro com doze. Seu objetivo na terapia: ser mais independente.

Dependia do marido para quase tudo, para ir ao supermercado, visitar uma amiga, ir ao médico, etc. Não fazia nada sem antes consultá-lo e ter a sua aprovação. Inclusive era ele quem estava pagando a sua terapia. Veio para o grupo e nas primeiras sessões ficou praticamente calada, só ouvindo. Em uma das sessões, um membro do grupo perguntou qual era o seu objetivo na terapia. Respondeu que era ficar mais independente do marido. Outro membro perguntou: – Como assim, mais independente do marido? Respondeu que era, por exemplo, ter seu próprio dinheiro para comprar as suas coisas. Acrescentou logo em seguida: “Só que tem um problema!”.

Nesse momento todos voltaram a atenção para ela e um dos membros perguntou qual era o problema, o que prontamente foi respondido: “Esta é a quinta sessão que venho ao grupo e ele (marido) já disse que no próximo mês não vai dar para continuar pagando a terapia”. O mesmo membro perguntou: Por quê? Respondeu que o marido disse que vai trocar de carro e a prestação é muito alta. Uma outra participante disse: “Estávamos conversando na sala de espera e você disse que o seu irmão está disposto a continuar pagando a sua terapia, não foi?”. Respondeu que sim e acrescentou “Sim, mas… Não vou aceitar, pois acho um absurdo meu irmão pagar a minha terapia enquanto meu marido resolve trocar de carro”. Houve um silencio e em seguida uma outra senhora disse: “Por que você não arruma um emprego que dê para pagar a terapia?” Respondeu que estava disposta, mas “acontece que não tenho uma profissão e além do mais já passei dos quarenta, fica muito difícil”. Respondeu a mais umas três sugestões com um “Sim, mas…”.

A esta altura a maioria dos participantes já haviam identificado o que estava ocorrendo e se calaram, enquanto um participante novato e “salvador” continuou com as sugestões, as quais eram todas rechaçadas com um “Sim, mas…”, até que um dos participantes denunciou o jogo.

Berne (Os Jogos da Vida) chamou este jogo de “Por que você não…? ___ Sim, mas…”. É um jogo que pode ser jogado por qualquer número de pessoas. O jogo tem início quando o agente apresenta um problema e os demais começam a sugerir soluções que normalmente tem início com “Por que você não…?” e o agente rejeita todas elas com um ” Sim, mas…” de maneira clara ou às vezes oculta na frase ou por frase semelhante como “Claro, sim…”, “você está certo…”, etc. O jogo termina quando todos desistem. É quando o agente vence. O término normalmente acontece com um silêncio que traduz a vitória do agente.
O jogador de “Sim, mas…?” não o faz com um propósito ostensivo, ou seja, um pedido Adulto de informação ou solução para um problema real, ele o faz com a finalidade de proporcionar segurança e gratificar a sua Criança.

No caso do exemplo acima, a cliente se apresentou como uma criança incapaz de fazer frente a uma situação de dependência do marido, enquanto os membros do grupo e particularmente um deles (“salvador”) se apresentaram como sábios pais ansiosos em demonstrar toda sabedoria em prol da criança insegura. Este jogo é propício a ter prosseguimento em virtude de que, em nível social, os estímulos e as reações são complementares, se apresentam de Adulto para Adulto e no nível psicológico também se complementam (estimulo de Pai para a Criança “Por que você não…?” e a resposta de Criança para o Pai “Sim, mas…” ).

O propósito do jogo “Sim, mas…” não é de conseguir sugestões, mas sim de recusá-las. Os jogadores normalmente não apresentam dificuldade de atuar nos dois papéis (Salvador e Vítima) embora possam ter preferência por um dos papéis. Segundo Berne (Os Jogos da Vida) clientes jogadores de “Sim, mas…” eventualmente pedem para serem hipnotizados ou ainda pedem que seja aplicado algum remédio ou alguma técnica maravilhosa que acelere o tratamento. São também hábeis em demonstrar que ninguém é capaz de dar uma sugestão aceitável, provando que todos são incompetentes.

A antítese para o ” Sim, mas…” é não responder ao estímulo, ou seja, só responder as situações claras e objetivas, ou perguntar: “O que você vai fazer a respeito?”, ou ainda dizer apenas: “Que pena”. Normalmente estas respostas deixam o agente sem saber o que fazer, isso poderá, na pior das hipóteses trazer à tona sua frustração, permitindo assim trabalhar na terapia estes aspectos.

Segundo Berne (Os Jogos da Vida), socialmente se o jogo for amistoso e inofensivo, não há problema nenhum em participar (primeiro grau). Afirma também o autor que se for, por exemplo, em uma tentativa de explorar os conhecimentos profissionais de alguém, aí será conveniente usar a antítese, o que poderá haver ressentimento causado pela exposição da Criança (primeiro ou segundo grau). Nesse caso, o melhor é fugir da jogada de abertura.

O “Sim, mas…” para ser jogado em terceiro grau teria que ter um final trágico, como todos os jogos de terceiro grau. Parece-nos um pouco difícil de ocorrer, mas se ocorresse seria mais ou menos assim: após muitas sugestões, e serem todas elas rechaçadas, o agente poderá ser explicito quanto a incapacidade dos participantes em darem sugestões. Um dos participantes, por exemplo, poderá reagir de modo violento com o agente ou surtar e ter que ser internado, etc.

Costumamos lidar com o jogo “sim, mas…” usando a antítese que Berne (Os Jogos da Vida) sugere conforme descrito acima, ou ainda, dependendo da situação, costumamos utilizar das quatro formas de responder a jogos segundo Dussay, conforme descrito a seguir.

Segundo Dussay (in: Caracushansky) existem quatro formas de responder a jogos psicológicos:

1 – Expor ou descobrir o jogo;
2 – Seguir o jogo;
3 – Ignorar o jogo;
4 – Oferecer uma alternativa.

1 – Expor ou descobrir jogo – O jogo poderá ser exposto diretamente pelo Adulto do terapeuta ao Adulto do cliente e em seguida é conveniente diagramar as transações envolvidas e mostrar o que está acorrendo.

2 – Seguir o jogo – Fazer o jogo com o cliente (conscientemente), em virtude do terapeuta perceber que é ameaçador para ele, ou que uma tentativa de expor o jogo foi rechaçada. É um recurso importante para facilitar a permanência do cliente na terapia, dando tempo para que ele possa perceber que existem opções.

3 – Ignorar o jogo – O jogo pode ser identificado e em seguida ignorado pelo terapeuta. Esta é uma decisão feita pelo Adulto do terapeuta, mudando de assunto, buscando outro tema mais interessante para o cliente, dando carícias positivas, etc.

4 – Oferecer uma alternativa – Passar para um jogo mais leve é uma alternativa, ou ainda, buscar uma resposta diferente daquela esperada pelo cliente, convidando-o a mudar de tema.

Bibliografia:

1 – Berne, E. Os Jogos da Vida, Editora Artenova, Rio de Janeiro.
2 – Caracushansky, S. Curso Avançado de AT de Base Psicanalítica, Editora Assertiva, São Paulo.